Ilustração de profissionais analisando exames de biópsia líquida em laboratório, realçando as inovações no tratamento do câncer de mama.

Medicamento de alta precisão para câncer de mama chega ao SUS

O tratamento do câncer de mama no Brasil acaba de ganhar um avanço significativo. O Ministério da Saúde anunciou a distribuição do primeiro lote do Trastuzumabe Entansina, medicamento de última geração usado no combate ao tipo mais agressivo da doença, o câncer de mama HER2-positivo. O remédio passa a ser oferecido gratuitamente pelo SUS, um alívio para quem antes precisava pagar mais de R$ 11 mil por frasco na rede privada.

A primeira remessa do Trastuzumabe Entansina, entregue em outubro, trouxe 11.978 unidades do medicamento para São Paulo. A distribuição foi feita às Secretarias estaduais de Saúde, responsáveis pela aplicação conforme os protocolos clínicos vigentes. Esse envio integra um cronograma que prevê mais três lotes, com entregas programadas para dezembro de 2025, março e junho de 2026. A expectativa é atender 100% da demanda atual do SUS e beneficiar 1.144 pacientes ainda este ano.

O professor Daniel Tiezzi, da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP, explica como o medicamento age no organismo. “O Trastuzumabe Entansina é um conjugado entre um anticorpo e uma droga. O Trastuzumabe, um anticorpo monoclonal direcionado à proteína HER2, é ligado à Entansina, um agente quimioterápico. Assim, além da terapia-alvo que reconhece as células que expressam a molécula, a quimioterapia também é entregue diretamente a essas células. Dessa forma, reduzimos os efeitos sistêmicos do tratamento e concentramos a ação do medicamento nas células malignas.”

O especialista destaca em quais estágios da doença o medicamento deve ser utilizado. “Uma das indicações é para casos de doença metastática, quando o tumor já se disseminou para outros órgãos além da mama. Ele também pode ser usado no tratamento adjuvante e, virtualmente, em todos os estágios da doença.” Segundo Tiezzi, a exceção fica para os casos muito iniciais. “Só não usamos esse tipo de terapia quando o tumor é muito pequeno, não há acometimento de linfonodos (estruturas que ajudam a defender o organismo contra infecções, inflamações e tumores) ou sinais de disseminação. Em todas as outras situações, ele pode ser empregado como tratamento adjuvante, após a ressecção cirúrgica do tumor primário.”

O professor também faz um alerta importante sobre a indicação da terapia. “O uso adjuvante desse medicamento é restrito aos pacientes que passaram previamente pelo tratamento neoadjuvante, ou seja, aqueles que receberam quimioterapia associada ao Trastuzumabe ou à combinação de Trastuzumabe com Pertuzumabe antes da cirurgia”, explica. Segundo Tiezzi, essa abordagem traz benefícios significativos. “Essa medicação tem um impacto importante, com melhora da qualidade de vida a longo prazo devido à redução do risco de recorrência da doença”, ressalta.

Impacto esperado

Segundo o Ministério da Saúde, o medicamento pode reduzir em até 50% a mortalidade entre as pacientes. Tiezzi explica que esse porcentual se refere ao risco de recorrência. “A gente chama de razão de risco, que é a chance de ter uma recorrência ou não. Essa porcentagem representa um ganho em termos de sobrevida livre de doença, ou seja, a paciente que recebe a terapia nessas condições tem menor chance de desenvolver a doença novamente após o tratamento.” Ele ressalta, no entanto, que o efeito não altera a sobrevida global. “O risco de a pessoa permanecer viva é o mesmo entre um tratamento padrão e um tratamento com o Trastuzumabe Entansina. Portanto, o que existe é uma redução do risco de apresentar a doença ou recorrência da doença, em um impacto de significado clínico”, conclui.

O professor também analisa os impactos do avanço no tratamento. “Como a medicação tem potencial para reduzir o risco de recorrência, esperamos que as pacientes tenham ganhos importantes em qualidade de vida. A doença recorrente quase sempre está associada à piora nesse aspecto, já que as pacientes precisam retomar terapias sistêmicas, o que certamente causa impacto”, afirma. Para o especialista, o benefício é direto. “Por isso, acreditamos que o uso do medicamento representa uma redução significativa nesse risco e, consequentemente, uma melhora relevante na qualidade de vida das pacientes”, completa.

Apesar do avanço, o especialista não acredita que a chegada do Trastuzumabe Entansina ao SUS, por si só, abra caminho imediato para a incorporação de outras terapias inovadoras contra o câncer. “Eu acho que as novas incorporações vão acontecer com o próprio desenvolvimento tecnológico que é esperado. A ideia é que a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias avalie o benefício, o custo e a efetividade de novas terapias no tratamento de doenças. Isso é uma avaliação contínua”, explica.


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