Após mais de duas décadas de estagnação terapêutica, o câncer de cabeça e pescoço localmente avançado teve um avanço promissor. No congresso da ASCO de 2025, foi apresentado o estudo REACH/NIVOPOSTOP, liderado pelo Institut Gustave Roussy sob coordenação do Dr. Jérôme Fayette. Ele mostrou que a adição de nivolumabe, um inibidor de PD‑1, à quimiorradioterapia adjuvante convencional, trouxe ganho relevante em sobrevida livre de doença (DFS) para pacientes com carcinoma espinocelular localmente avançado e fatores de alto risco após cirurgia. Os dados de sobrevida global ainda estão em maturação, mas o avanço já é considerado um marco.
Até então, o protocolo padrão — quimioterapia à base de platina associada à radioterapia — estava em uso há mais de 20 anos, com eficácia, mas com alta toxicidade e risco de recidiva, especialmente em casos com margens comprometidas, invasão perineural, extracapsular ou tumores HPV‑negativos. O uso da imunoterapia nesse contexto representa um novo paradigma.
A estratégia do estudo REACH é sólida: integrar nivolumabe à radioquimioterapia para potencializar a resposta imune induzida pelo dano tumoral, eliminando micrometástases e diminuindo a chance de recorrência. Os dados revelam benefício clínico claro, particularmente em subgrupos com perfil imunológico mais ativo, reforçando a importância da estratificação por biomarcadores e do tratamento personalizado.
Embora seja necessário cuidado com o aumento de toxicidade, os efeitos colaterais foram considerados aceitáveis frente ao ganho no controle da doença. É o primeiro estudo em mais de 20 anos a mostrar benefício expressivo em desfechos clínicos relevantes em câncer de cabeça e pescoço de alto risco no cenário curativo.
Esse resultado sinaliza mudança de mentalidade: a imunoterapia, já validada em cenários metastáticos e avançados, agora entra com força na fase curativa inicial. Isso exigirá revisão de protocolos, redefinição dos critérios de indicação e acompanhamento prolongado.
Com esses resultados, espera-se a avaliação rápida do regime combinado por agências regulatórias internacionais e no Brasil, além de atualização das diretrizes científicas para incorporar a imunoterapia como opção adjuvante. Será essencial preparar sistemas de saúde públicos e privados para adotar essa nova abordagem, garantindo acesso equitativo e capacitação das equipes multidisciplinares.
Conclui-se que o estudo REACH representa um divisor de águas no tratamento do câncer de cabeça e pescoço. A oncologia nesse campo supera um período de pouca inovação e passa a incorporar a imunoterapia desde o início da trajetória terapêutica. Sem dúvida, é o avanço mais relevante da área em 20 anos — e marca possivelmente o começo de uma nova era no combate à doença.
Com informações de Medicina S/A; imagem Freepik
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